Os motoristas do BRT entraram em greve. O presidente do consórcio de empresas que opera o sistema diz que não há dinheiro para pagar salários e nem para combustível.
O que está acontecendo?
Vamos começar com uma história. Há alguns anos atrás, quando o BRT ainda estava em construção, um de meus amigos, morador da Barra, teve a chance de conversar com o então vice-governador do Rio, e lhe disse sobre sua preocupação com o BRT que, na sua visão, seria um desastre.
A resposta do político foi:
“Sabemos que o BRT não é a solução, mas é o que dá pra fazer até a eleição”.
Os transportes do Rio vão mal porque obedecem a uma lógica maluca na qual o que menos importa é a satisfação do usuário.
Quem usa ônibus no Rio sabe que parecem carroças. Na verdade, são chassis adaptados sobre carrocerias de caminhão – quentes, desconfortáveis e frequentemente conduzidos a velocidades fatais.
É verdade que a queda de passageiros, causada pela pandemia, está ferindo de morte várias empresas de transportes. Mas esse golpe atinge um sistema que já era caótico, ineficiente e desrespeitoso com o usuário.
O sistema de transportes do Rio serve principalmente aos políticos e às empresas a eles associadas. O usuário que se vire.
O tempo de viagem entre casa e trabalho no Rio é o MAIOR de todas as regiões metropolitanas do país. Os usuários de menor renda são os que mais gastam tempo e dinheiro com transporte.
O primeiro passo para um sistema de transportes eficiente é um traçado adequado da rede de linhas de ônibus, e a integração total entre ônibus, trem, metrô e barcas. No Rio, além da integração ser pouca, cara e ruim, o ônibus compete com o trem e o metrô, ao invés de se complementarem.
Os contratos com as empresas, feitos através de Editais de Concessão e Termos de Adesão das Permissões e Autorizações, também são muito ruins, cheios de inconsistências que afetam a concorrência entre as empresas e a sua eficiência, além de aumentar o isolamento entre os modais.
Não existe, nesses contratos, um mecanismo de avaliação de desempenho com penalidades e cancelamento da outorga. Não há uma garantia clara de transferência de parte dos ganhos de produtividade das empresas para os usuários. A especificação do número e da qualidade dos serviços a serem oferecidos é sempre frágil, ambígua ou incompleta, e os prazos excessivamente longos e sem coerência com amortização de ativos
As exigências absurdas dos editais fazem com que as empresas habilitadas a concorrer sejam sempre as mesmas.
Para completar, o poder público não tem acesso direto às informações sobre número de passageiros e faturamento, que ficam em um sistema sob o controle das empresas.
O que é preciso fazer? Não é nenhum mistério.
O objetivo principal deve ser melhorar a qualidade do serviço, reduzir as tarifas e os tempos de viagem, e trazer eficiência e transparência aos contratos, com uma operação que atenda à necessidade dos passageiros.
Para evitar o colapso do setor é preciso rever os contratos e redesenhar os trajetos das linhas de ônibus, para que elas sejam realmente integradas com trem, metrô e barcas, e estudar uma nova licitação que traga inovação, transparência e redução de tarifas.
O sistema de bilhetagem, hoje operado pela RioCard, deve ser operado pelo município ou por uma entidade independente, para que a administração pública tenha acesso imediato e direto às informações.
E para que os transportes do Rio de Janeiro estejam, finalmente, a serviço dos usuários.