“Não é Nada Pessoal” – O Brasil e a Banalidade do Mal

É difícil conter a raiva ao assistir vídeos de guardas agredindo ambulantes. É difícil conter a náusea diante das imagens de fiscais multando estabelecimentos comerciais por estarem funcionando.

Era uma crise de saúde. Foi transformada, por inépcia, incompetência, corrupção e ideologia em um desastre econômico e social.

Enquanto privilegiados em posições de poder ganham fortunas com compras e gastos que nunca serão explicados, o pequeno empresário e o empreendedor individual – o ambulante, o camelô, o prestador de serviço – são esmagados pelo “fecha tudo” do Estado.

Enquanto isso, nas favelas – 1.400 só no município do Rio – vale tudo.

Nem os guardas e nem os fiscais vão lá, é claro.

Favelas são defendidas com fuzis e – mais importante – são produtoras de votos.

Muitos votos.

É assim que sempre caminha a política brasileira: perigosamente equilibrada entre o populismo, a corrupção, o crime e – agora – a tirania.

Voltemos aos vídeos: em uma das cenas, a fiscal diz que vai multar.

A dona da birosca – uma cidadã comum, sem nenhum poder – implora: “por favor, não faça isso”.

A fiscal diz: “não é nada pessoal

Então: é isso.

Vamos transformar o país em um amontoado de gente apavorada, pobre e faminta.

Mas não é nada pessoal.

Hannah Arendt, em seu livro Eichmann em Jerusalém, fala da “banalidade do mal” – o mal monstruoso que acontece como resultado da ação de milhares de funcionários que só estão cumprindo ordens.

O guarda municipal de Santos manda o ciclista parar e pergunta: “o senhor está indo pra onde?”. A resposta não o satisfaz. O cidadão será multado. Não existe uma definição melhor do que é totalitarismo e arbítrio.

Em alguma cidade paulista, outra fiscal – arrumada e maquiada – chega em uma loja, cuja porta está meio fechada, e pergunta: “O senhor está funcionando?”. O dono nega. Não importa. Ela anuncia: “o senhor será autuado”.

Autuado por trabalhar em uma atividade lícita e legalizada, dando emprego a várias pessoas.

Em um restaurante, a mesma fiscal anuncia: “Eu vou fazer uma autuação porque vocês estão com a porta aberta”. O dono diz: “abri a porta para colocar o lixo para fora, o restaurante está vazio”.

A fiscal responde: “você poderia ter aberto só meia porta”.

É isso o que o Brasil se tornou: um campo de treinamento de pequenos tiranos ocupados em banalizar o mal.

Esse é o legado que os gestores da pandemia deixam aos brasileiros: um aprendizado de medo e subserviência; um estágio preliminar antes que se escancarem as portas da falência, do desemprego, da fome e do desespero.

Até que, finalmente, cheguemos à tirania institucionalizada.

Uma tirania plantada e regada com cuidado pelos mesmos homens públicos – governadores, prefeitos, legisladores e magistrados – que falam todos os dias em democracia, direitos e dignidade.

 


Foto: pelotão de fuzilamento da NKVD a polícia secreta soviética, executa um dissidente.

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